Convento de Santa Maria do Bouro

AMARES (Portugal): Convento de Santa Maria do Bouro.

O antigo convento cisterciense de Santa Maria do Bouro é, desde 1994, e na sequência do projecto de reconversão da autoria do arquitecto Souto Moura, uma das várias Pousadas de Portugal instaladas em imóveis de valor patrimonial. A história deste complexo conventual é, no entanto, bastante mais remota, recuando até aos primórdios da nacionalidade. Apesar de não se conhecer com exactidão a origem de Santa Maria do Bouro, é hoje aceite que este teve início num mosteiro habitado por eremitas, cujo orago era São Miguel. Só mais tarde, nos finais do século XII, é que os cistercienses se terão instalado no local, o que coincidiu com a alteração da invocação para Santa Maria. Muito embora as crónicas sobre a Ordem tenham divulgado versões díspares, os poucos documentos subsistentes, passados por D. Afonso Henriques, parecem coincidir na interpretação atrás exposta (SOUSA, 1979, p. 46). Permanecem, contudo, muitas dúvidas relativamente às datas da fundação cisterciense. Artur de Gusmão (1956) refere o ano de 1174 como data aproximada, enquanto Maur Cocheril (1966) aponta para 1195, indicando ainda que, apenas em 1208, o mosteiro é referido nas actas do capítulo geral de Cister (IDEM). Escavações arqueológicas recentes (1994) vieram revelar um espólio cerâmico e uma série de elementos arquitectónico-decorativos, cuja cronologia remonta, exactamente, ao final do século XII e inícios do XIII (FONTES, 2001).
Desde o primeiro complexo monacal até à actualidade, Santa Maria do Bouro foi alvo de várias campanhas de obras e intervenções de âmbito decorativo. Mas, tal como as referidas escavações vieram provar, o modelo planimétrico conservou-se "sem grandes roturas". O edifício original, com igreja de três naves de cabeceira tripartida de planta rectangular, e edifícios conventuais estruturados em função do claustro, conheceu uma ruína constante, motivada, principalmente, pelo regime dos abades comendatários. Só a partir de 1567, com a criação da Congregação Autónoma Portuguesa, foi possível inverter esta tendência de degradação.
As obras decorreram entre o final do século XVI e o início da centúria seguinte, originando uma igreja de características maneiristas, com galilé a anteceder a nave única, de capelas intercomunicantes e transepto inscrito, e dependências conventuais formando um U com claustro a Sul. As intervenções prolongaram-se até meados do século XVIII, datando deste último período as campanhas decorativas de talha e azulejos. Na impossibilidade de caracterizarmos todos os espaços, optámos por destacar algumas das obras mais significativas que, de acordo com estudos recentes de Luís de Moura Sobral (2000, pp. 233-246), definem um programa iconográfico baseado na invocação a São Bento e São Bernardo, e que relaciona a história de Portugal com a do convento e com a fundação da congregação cisterciense portuguesa. Na fachada do templo, com galilé aberta por três arcos de volta perfeita (solução tradicional da arquitectura portuguesa), exibem-se as imagens de São Bernardo e São Bento, com a Virgem ao centro. O mesmo tema volta a repetir-se no retábulo-mor, mas invertido, e no cadeiral (final séc. XVII-início XVIII), este último considerado um dos mais importantes exemplares do país, onde os espaldares relatam episódios da vida do santo fundador e do santo reformador, e em que cada relevo parece constituir um espelho do que se encontra defronte, obrigando a uma interessante leitura em ziguezague. Se os episódios aludem à vida mística dos santos, o único relato de conteúdo político acentua a leitura da galeria de figuras na fachada do próprio convento, onde encontramos a representação das personagens mais significativas para a história da Ordem e do convento - o conde D. Henrique (?), D. Afonso Henriques, D. Sebastião, o cardeal D. Henrique, e D. João IV. Por sua vez, a Sagrada Família, ou o Regresso do Egipto, aludem ao desterro e à época anterior à Congregação Autónoma, que a galeria de reis também celebra.
(RC)


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